O primeiro seminário Terra Comum teve como objetivo contribuir para a produção de outros imaginários sobre os modos de ocupação e uso do território e o direito aos bens comuns. As palestras tiveram por tema formas de resistência, direitos e tradições, que visam outro ponto de partida que não o da propriedade, privada ou pública.

Temas como o uso comum da terra, o acesso à água, a formação de redes, a violência, as resistências e as lutas pelos direitos à terra e aos bens comuns, as culturas tradicionais, as novas formas de compartilhamento da terra e do trabalho foram norteadores das palestras.

O crescente número de conflitos relacionados ao acesso à terra e aos bens naturais, e a transformação do espaço e dos modos de vida em modelos cada vez mais restritivos, individualistas e destrutivos dos modos de vida coletivos, seja em áreas urbanas ou rurais, nos motiva a pensar e agir. Os espaços produzidos e assegurados pela regulação da terra, com argumentos econômicos e ambientais, contraditoriamente levam à contínua destruição do ambiente e dos modos de vida a eles associados. Hoje, em diversos pontos do planeta, a guerra é permanente. O mesmo ocorre no contexto brasileiro, onde historicamente, desde a invasão e exploração portuguesa no século XVI, desdobram-se levantes, confrontos, rebeliões, lutas, guerras, tendo por motivação o acesso à terra, ou mais ainda, ao território.

As comunidades tradicionais são suplantadas pelo agronegócio, os parques e reservas de água são explorados pelas mineradoras ou pela indústria extrativista, as cidades são metropolizadas pelo capital financeiro. Torna-se necessário discutir não apenas tais conflitos e resistências, mas investigar o que permanece até hoje e é reinventado à luz de tais embates. Assim, faz-se urgente também refletir sobre as raízes dos conflitos no Estado moderno, separado e em contradição com a sociedade civil, tendo por pressuposto a proteção dos grandes capitais. É preciso apontar novos imaginários.

Em um debate amplo e aberto ao público, o evento pretendeu ampliar e aprofundar o conhecimento sobre o assunto, revendo experiências e tradições, buscando movimentos sociais que lidam com a construção de novos modos de ocupação do território, abrindo caminhos para outros paradigmas e imaginários para o presente e o futuro. O objetivo final foi produzir repertório para outros tipos de coletividade, baseados na propriedade ou no uso, que questionem a hegemonia do modo de produção capitalista.

O Seminário se organizou em torno de três sessões temáticas: Espaços e Tradições, Lutas e Cotidiano, e Direito a Terra e Novas Formas de Propriedade, que aconteceram nos dias 23, 24 e 25 de maio de 2018. Durante as tardes as temáticas foram trabalhadas no Laboratório de criação aplicada à terra.

SEMINÁRIO


ABERTURA

Rogério Faria Tavares e Louise Ganz


MESAS

01

Espaços e tradições 23.05

Zeca Gavião

Mary Francisca Guimarães

Jonathas de Andrade

Nazareno José de Campos

Mediadora: Ana Paula Baltazar

02

Lutas e cotidianos 24.05

Alceu Castilho

Serge ZAD

Lurdinha Lopes

Leandro Minuchin

Oscar Oliveira

Mediadora: Silke Kapp

03

Direito à terra e novas formas de coletividade 25.05

Edésio Fernandes

Renato Cymbalista

Mediador: Frederico Canuto

AberturaDia 23 de maio, 19h

Rogério Faria Tavares

Rogério Faria Tavares é diretor-presidente do BDMG Cultural. Mestre em Direito Internacional pela UFMG, é diplomado em Direito Internacional e Relações Internacionais pela Universidade Autônoma de Madri. É autor do livro “Entre el Derecho y el poder: el Consejo de Seguridad y la Corte Penal Internacional en la situación del Sudán”. Editor do site www.literaturanainternet.com.br, é membro da diretoria da Casa dos Jornalistas de Minas Gerais e da Associação Brasileira de Imprensa.

Louise Ganz

Louise Ganz é artista e arquiteta. Atua na interface entre arte contemporânea, cidade e natureza, focando em questões relativas ao uso e ao acesso à terra e a produção de narrativas e ficções visuais. Realiza trabalhos em diversas mídias e exposições em instituições de arte. Possui textos publicados em revistas e livros. É co-fundadora do grupo Thislandyourland (thisland.tumblr.com). Idealizadora do seminário Terra Comum, junto com Ana Paula Baltazar.

01

Espaços e tradiçõesDia 23 de maio, 19h

A consciência histórica da tradição e a contínua construção de formas de resistência. A resistência intercultural para manutenção das tradições e da terra na Reserva Mãe Maria, no sudeste do Pará; a tradição na favela e a experiência de reconhecimento na Vila das Antenas em Belo Horizonte; a perspectiva da arte sobre as relações de poder, raça, classe e a exploração da força de trabalho no Brasil; e uma leitura das tradições e da terra comum no Brasil.

Palestrantes

Zeca Gavião

Pepkrakte Jakukreikapiti, Cacique do povo Gavião Kyikatêjê, da Reserva Indígena Mãe Maria, localizada no município de Bom Jesus do Tocantins, no Sudeste do Estado do Pará. Convidado a narrar a experiência de defesa e proteção da terra indígena. A implantação de grandes projetos de caráter “desenvolvimentista” como a passagem da Rodovia BR 222, dos “linhões de transmissão” da Eletronorte e da Estrada de Ferro Carajás da Companhia Vale do Rio Doce dentro da terra indígena ocasionou conflitos vinculados à soberania e à autodeterminação deste povo.

Mary Francisca Guimarães

Moradora da Vila das Antenas e formadora do grupo História em Construção na Vila das Antenas, produção autônoma e história do espaço cotidiano em BH. É professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, em cursos de formação de professores e em escolas da rede privada, níveis fundamental e médio de ensino.

Jonathas de Andrade

Artista visual, nasceu em Maceió e vive em Recife. Utiliza fotografia, instalação e vídeo para construir narrativas que atravessam memória coletiva e história, fazendo uso de estratégias que misturam ficção e realidade. Trabalha com temas que tocam as relações de poder, raça, classe e a exploração da força de trabalho no Brasil. Já expôs individualmente em Nova York, Cidade do México, Toronto e Lisboa. Atualmente, seu projeto Eu, mestiço faz parte da exposição Corpo a Corpo, do Instituto Moreira Salles.

Nazareno José de Campos

Professor da Universidade Federal de Santa Catarina, com atuação na área de Geografia Regional, em especial Geografia de Santa Catarina, Geografia da América Latina e Geografia da África. Na pós-graduação vem atualmente desenvolvendo atividades e discussões sobre a Geografia Histórica do Brasil, com ênfase no período colonial e império. Tem se aprofundado na discussão de temas ligados a formas de uso comum da terra e demais bens naturais; assim como sobre a caracterização e dinâmica sócio-espacial das chamadas populações tradicionais.

Mediadora: Ana Paula Baltazar

Graduada em Arquitetura e Urbanismo, mestre em Arquitetura, e PhD em Arquitetura e Ambientes Virtuais. É Professora Associada do Departamento de Projetos da Escola de Arquitetura e do Núcleo de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFMG e também pesquisadora na UFMG onde co-coordena os grupos de pesquisa MOM (Morar de Outras Maneiras) e LAGEAR (Laboratório Gráfico para Experimentação Arquitetônica). Tem se dedicado à pesquisa de interfaces (físicas, digitais e híbridas) para ampliar as possibilidades de autonomia coletiva e emancipação cidadã na produção do espaço.

02

Lutas e cotidianosDia 24 de maio, 19h

As lutas anti-capitalistas pelo direito aos bens comuns, seus mecanismos de ação e os desdobramentos no cotidiano. A privatização da terra e a perspectiva do observatório jornalístico sobre agronegócio no Brasil; as formas de ocupação como resistência, a construção eventual de uma comunidade, as conquistas e os riscos de desmanche da ZAD (Zone à Défendre), França; as conquistas, os modos de manutenção e o trabalho coletivo na Ocupação Manoel Congo; e uma leitura da resistência sócio-espacial na Argentina.

Palestrantes

Alceu Castilho

Jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduando em Geografia Humana na USP. Autor do livro “Partido da Terra – como os políticos conquistam o território brasileiro” (Editora Contexto, 2012). Editor e coordenador do De Olho nos Ruralistas, um observatório jornalístico sobre agronegócio no Brasil: http://www.outraspalavras.net/outrosquinhentos/projects/de-olho-nos-ruralistas/

Serge (ZAD – Zone à Deféndre)

Habitante e militante da ZAD (Zona a Defender) de Notre-Dame-des-Landes, na França. Participou da luta contra a construção do aeroporto nesta região, desde 2009, através de diversos coletivos e associações em apoio às lutas no campo. Grande parte do território da ZAD tem sido utilizado para desenvolver atividades fora do sistema comercial capitalista e para preservar a biodiversidade local. Serge participa da organização de hortas comunitárias e encontros locais e internacionais e da implementação de uma cooperativa para fornecimento de alimento tanto para a autonomia alimentar dos moradores da ZAD, quanto para os vários movimentos sociais da região.

Lurdinha Lopes

Militante do Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM-RJ. A Ocupação Manoel Congo/MNLM, completou 10 anos de resistência na construção da Política Nacional de Habitação de Interesse Social. Apesar dos dispositivos legais que destina os imóveis públicos vazios à Moradia Popular e obrigam a propriedade a cumprir sua Função Social, este é um dos raros exemplos de cumprimento da Lei e ainda assim objetivado pelo próprio povo organizado.

Leandro Minuchin

Professor de Arquitetura e Urbanismo Global na Escola de Arquitetura de Manchester. Tem formação em teoria política e obteve qualificações em estudos latino-americanos e urbanos. Sua pesquisa enfoca a política de construção na América Latina. Trabalhou com movimentos sociais urbanos, práticas arquitetônicas e organizações locais no desenvolvimento de intervenções populares de infra-estrutura na Argentina e no Equador. Atualmente está trabalhando em monografia abordando práticas pré- figurativas e luta urbana na América do Sul.

Oscar Olivera (não pôde comparecer)

Discute o direito à água. Liderança popular e articulador da Guerra da Água em Cochabamba, Bolívia, em 2000. No episódio, indígenas, camponeses e trabalhadores urbanos conseguiram que a água continue sendo um bem comum e a desprivatização do serviço de abastecimento de água de Cochabamba. Junto com a Guerra do Gás a Guerra da Água abalou a política boliviana no começo do século XXI e mudou a correlação de forças no país.

Mediadora: Silke Kapp

Arquiteta, mestre e doutora em Filosofia. Atualmente é professora associada da Escola de Arquitetura da UFMG e líder do Grupo de Pesquisa MOM (Morar de Outras Maneiras). Tem experiência na área de Arquitetura, Urbanismo e Planejamento, atuando principalmente nos seguintes temas: teoria crítica da arquitetura e da cidade, habitação, produção do espaço cotidiano, interfaces para a autonomia, metodologia da pesquisa sócio-espacial.

03

Direito à terra e novas formas de coletividadeDia 25 de maio, 19h

Mecanismos jurídicos de acesso à terra, aos bens comuns e à moradia na proposição e implantação de novas ou outras formas de coletividade. Uma leitura histórica e prospectiva do direito pelo viés do comum; novas agendas para ocupação popular da terra rururbana via agroecologia; alternativas de moradia para além da propriedade privada, como aluguel social.

Palestrantes

Edésio Fernandes

Escritor, professor, pesquisador e consultor. Trabalha com reformas da ordem jurídico-urbanística no Brasil, na América Latina e em outros países.

Mirinha Muniz (não pôde comparecer devido à paralisação dos caminhoneiros)

Integrante da direção estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Em 8 de março de 2017, mulheres sem-terra lideraram cerca de 600 famílias na ocupação da fazenda Santa Terezinha, propriedade improdutiva do empresário Eike Batista localizada no município de Itatiaiuçu, região metropolitana de Belo Horizonte (MG). Hoje, o local que se tornou sede do Acampamento Maria da Conceição já se destaca pela produção agroecológica.

Renato Cymbalista

Arquiteto e urbanista, mestre e doutor pela FAU-USP, com pós doutorado em História pela UNICAMP. Foi professor convidado nas universidades Técnica de Brandemburgo; Paris-Diderot; Parsons - the New School of Design. Foi editor adjunto da Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais. É um dos diretores do Fundo Imobiliário Comunitário para Aluguéis (FICA), em São Paulo, que é um fundo gerido pela Associação pela Propriedade Comunitária, formalmente registrada, sem fins lucrativos. Interessado no problema da moradia, da especulação imobiliária e dos deslocamentos na cidade, que sonha com uma cidade menos desigual. https://www.fundofica.org

Mediador: Andityas Soares Moura Costa Matos (não pôde comparecer devido à paralisação dos caminhoneiros)

Doutor em Direito e Justiça pela Faculdade de Direito e Ciências do Estado da UFMG e Pós-Doutor em Filosofia do Direito pela Universitat de Barcelona (Catalunya). Professor Adjunto de Filosofia do Direito e disciplinas afins na UFMG. Professor Visitante na Facultat de Dret de la Universitat de Barcelona entre 2015 e 2016. Professor Residente no Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares – IEAT/UFMG entre 2017 e 2018. Atua e tem experiência em Filosofia do Direito, principalmente nos seguintes temas: normativismo, estado de exceção, biopolítica, debate Kelsen e Schmitt, autoritarismo e democracia, desobediência civil e democracia radical.

Mediador: Frederico Canuto

Arquiteto e urbanista, mestre em Análise Critica e Histórica do Urbanismo e Arquitetura / Planejamento Urbano e Doutor em Poéticas da Modernidade, atualmente é professor na Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais no Departamento de Urbanismo e membro permanente do Núcleo de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da mesma instituição. Atualmente é líder do grupo de pesquisa "Narrativas Topológicas", coordena o projeto "Narrativas Indígenas" dentro do programa extensionista "Morar Indígena", desenvolve como coordenador os projetos de pesquisa "Narrativas da Violência: Junto, de perto e de dentro" e "Plataformas democráticas: Escolas como Agentes de Planejamento Urbano".

Dias: 23, 24 e 25 de maio de 2018

Horário: 19h às 22h

Local: Auditório do BDMG

Rua Bernardo Guimarães, 1.600, Lourdes. Belo Horizonte - MG

Equipe

Realização de entrevistas: Ana Paula Baltazar | Louise Ganz

Produção: Regina Ganz

Produção gráfica e de material: Isabela Izidoro

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